“No
início do ser cristão não existe uma grande ideia ou uma decisão ética, mas sim
um encontro. Um encontro com uma Pessoa concreta que dá à vida um novo
horizonte, um rumo decisivo”.
Onde
está a sua assinatura?
Porque
não é a sua existência indiscutível?
Porque
é que Deus ama?
Guarda
alguma analogia connosco?
Qual
o seu papel na condução do homem e da História?
É
possível conhecer?
É
possível conhecer Deus pela ciência?
O
que é a Razão?
Quisera ser louco…
1 - O que é Deus ou Quem é Deus?
Sem dúvida, Quem é
Deus. Deus ou é um Ser, o Ser, ou não é nada. Se queremos discutir Deus, então
é bom que à partida nos entendamos no que estamos a discutir, de outro modo
estaremos encarniçadamente a discutir coisas ou pessoas diferentes. E deste
modo, ninguém avança.
Por Deus entendemos um intelecto intuitivo, i.e.,
alguém que conhece no acto de existir. O que significa isto?
Cada um de nós conhece as coisas APÓS elas
existirem. Os nossos pais já cá estavam, os nossos irmãos andavam na barriga da
nossa mãe e quer coisas quer pessoas entram na nossa vida já depois de
existirem. Para Deus não é assim. Ele cria, logo tudo o que existe, existe por
seu intermédio. Por conseguinte, as coisas ou pessoas não lhe pré-existem. Ele
não só já cá estava, como a existência das pessoas ou das coisas, saem Dele.
Portanto, crer ou não crer, mas num ser definido
deste modo. Um intelecto intuitivo, criativo e Criador.
2 - Porque Deus ama?
Deus tem a liberdade de criar ou não criar, i.e.,
ele não cria tudo o que é concebível. Por exemplo não cria unicórnios ou
sereias. Portanto Deus decide aquilo que vale a pena criar. Ama aquilo que criou.
3 – Guarda Deus alguma analogia connosco?
Kant dizia que ao homem cabe apenas um intelecto
discursivo, i.e., as coisas pré-existem ao acto de conhecimento. Uma crítica que se pode formular é que existe
apreensão de conhecimentos que não se processa pelos sentidos. Um exemplo é o
êxtase dos santos e os milagres, mas fora da religião temos aquilo que é
denominado por percepção extra-sensorial, os fenómenos déjá vu, etc.
Mas existe um fenómeno mais “terreno” e mais
consensual que ilustra a natureza intuitiva do intelecto humano. O exemplo é a
arte. Para o artista, a obra de arte sai de si próprio, ele conhece-a no acto
da existência. Ele também interage com o que criou. Por isso existem rascunhos,
rabiscos, maquetes,…Ele risca, corrige, apaga, reescreve; pinta, repinta e
volta a pintar; desenha, apaga e volta a desenhar; toca e retoca, pausa e…volta
a tocar. No final fica a obra prima. E ela não pode deixar de ser querida a
quem a criou. Porque criação é separação, todo o artista ama aquilo que criou.
4 – O papel de Deus é intuído pela necessidade de
existir um ordenamento moral. Quer a epopeia judaica, quer o milénio da Europa
cristã, demonstram bem que não é o ordenamento particular de cada cabeça humana
que pode fornecer um ordenamento jurídico comum. Kant propô-lo mas
contraditou-se fatalmente ao confessar que cada homem apenas transporta o seu
próprio bem-estar no coração. O sofisma do nosso tempo, com as diversas
interpretações da lei, com a advocacia, com a deriva ética, quer nos valores
humanos quer na alta finança, apenas exprime a desancoragem deste referencial
sólido.
O futuro não é fixo, ele é determinado por uma
série de acontecimentos ou factos inesperados, ele não tem a inércia de uma
continuidade homogénea, sofre saltos, muitas vezes por catástrofes naturais,
por catástrofes sociais, por catástrofes humanas ou pela existência de pessoas
ou acontecimentos extraordinários. Encontram-se nesta categoria as aparições de
Fátima, Joana d’Arc, o assassinato de John F. Kennedy, a vida de Lutero ou de
Henrique VIII, etc.
5 – Não é possível pretender obter um conhecimento de
Deus pela ciência e, ao mesmo tempo afirmar que não é possível conhecer. É
verdade que o conhecimento científico assenta na observação, ele é indutivo,
baseia-se em factos observáveis. As coisas são como são observadas, não são
assim porque não pudessem ser de outro modo. Mesmo quando utilizamos o
telescópio Hubble, um microscópio electrónico, um acelerador de partículas ou uma
reacção de DNA por RT-PCR, na verdade apenas estamos a utilizar
ferramentas que prolongam os nossos olhos.
Ora, não é possível ser-se um adepto da ciência, para
negar a existência de Deus, e simultaneamente dizer que não existe possibilidade
de conhecer. Não se encontra para este argumento outro significado que pura
estupidez. Não é possível!
No que concerne à aplicação da lógica na
investigação da existência de Deus é verdade que as posições não são
equivalentes. Enquanto que ao crente basta afirmar a possibilidade da
existência de apenas um ser de grandeza máxima, o intelecto intuitivo que é e
que ama; ao ateu cabe a tarefa monstruosa de afirmar que de todos os seres
possíveis existentes, nenhum é jamais em circunstância alguma, por qualquer que
seja o critério lógico utilizável, um intelecto intuitivo que ama, um ser
imortal de grandeza máxima. Percebe-se a dificuldade de analisar todos os seres
possíveis existentes. Percebe-se a dificuldade das provas testemunhais de um
dos povos mais instruídos da Terra, o povo judeu, cuja epopeia é, basicamente,
a história de uma relação. Percebe-se a dificuldade das catedrais, da história
europeia, do saber grego, do método científico com raiz na escolástica, das
primeiras universidades. No caso português, até na sua História, na sua
heráldica, no baptismo de índios e negros e, devido a isso, na miscigenação.
Pode obter-se uma evidência
indiscutível da existência de Deus pela ciência? A resposta é não. Ela está no
livro do Génesis, escrita muito antes destes aprendizes de feiticeiros, crentes
e ateus, verdadeiros saltimbancos do nosso tempo.
Deus diz a Moisés que ele
apenas O pode vislumbrar de costas, após a sua passagem.
Nós só obtemos provas
da existência de Deus, pelo seu efeito nas coisas. Por observar que uma razão
com analogia com a nossa preside ao universo. Que nós, se pudéssemos,
provavelmente teríamos feito o universo assim. Uma experiência única é seguir
um trilho numa floresta, acompanhado por um batedor experiente. É incrível aquilo
que ele vê e nós não. O número de pessoas no trilho, incluindo mulheres e crianças; o tempo que se demoraram em cada etapa do caminho,…
É necessário ter o treino certo e ser bom observador para
colher vestígios que outros não vêem.
É isso que são as profissões.
Assim é a ciência.
É isso que são as profissões.
Assim é a ciência.
Assim é a presença de Deus na ciência.
As
coisas estão lá, a única coisa que é necessário é mudar o nosso olhar.
Por
exemplo, o caso da sequência de Fibonacci e as espirais (1,1,2,3,5,8,…um número
é obtido pela soma dos dois que o precedem). As espirais encontram-se no coruto
da nossa cabeça, no pavilhão dos ouvidos, nas conchas, na casca do caracol, nas
flores como o girassol, no ananás, nas pinhas de pinheiros, ramos de árvores,
nas ondas do mar, nos furacões, em tornados, em funis nos oceanos ou na água
que escoa do nosso lavatório, em certas orbitais atómicas ou nas galáxias, nas
impressões digitais ou em construções como o Parténon.
6 – A ciência está acabada. Nós limitamo-nos a descobrir o que já está, o que é. No tempo de Aristóteles já estava presente o
universo da mecânica clássica, da mecânica quântica, da relatividade. O ADN
existe desde que há vida sobre a Terra. A técnica é a nossa criação, a aplicação das nossas descobertas
às nossas necessidades. Se o homem continua a caminhar sobre o tapete da
ciência, a tentar descobrir o que já lá está, por vezes com recuos e
correcções, porque razão é exigido ao homem que não possa caminhar no tapete da
fé? Porque razão a descoberta da fé tem que estar terminada? O facto de o
homem não saber tudo sobre a fé, implica tanto a não existência dela, como o
facto de o homem não saber tudo sobre ciência implica a inexistência desta. Não
estão ambas terminadas? Deus não é Deus e o Universo não é o Universo? Então, por o homem se encontrar a caminho, de uma e de outra, isso tem que
implicar a existência de uma e a inexistência da outra?
7 – O que é a razão? De tudo o que foi dito, uma
coisa o pensamento não é: mecânico! Ele é criativo e livre. Em ciência, o
mecanicismo há muito ocupa o seu pequeno lugar. Sempre que se encontra uma
evidência nova contra uma teoria, a ciência tudo refaz, não se limita a somar.
Foi assim com a teoria quântica e a teoria da relatividade, foi assim com Ramon
e Cajal e a sua teoria sobre o sistema nervoso central. A razão humana não se limita e recolher dados por observação,
ela é também dedutiva e criadora. Só assim se compreende que a música e a
pintura acompanhem a filosofia.
Discutir Deus apenas na dimensão da ciência é
reduzir Deus e o Homem, é entrar para uma caixa.
E como para acreditar na
ciência é necessário acreditar que é possível conhecer, que o conhecimento
apreendido pelos sentidos guarda alguma conexão com a realidade, que a razão
humana é confiável, então uma razão circunscrita à ciência é, também ela, um
acto de fé. E é chegado aqui que o sofista moderno tão defensor da ciência,
acaba a defender o determinismo, o pensamento mecânico, a impossibilidade de
conhecer, a incerteza na sua própria existência ou na dos outros. Este ser
racional, que quer enfiar todo o universo dentro da sua pequena cabeça, entrou
para uma caixa e, como qualquer louco, chama-nos a ela. O seu pensamento
circular mata toda a criação; apagaram-se as últimas luzes, o crepúsculo
abateu-se sobre ele para sempre. Tão cedo não abandonará a jaula…
8 – A assinatura de Deus é Jesus Cristo. Só a Ele e
por Ele podemos contemplar Deus face a face. Conhecer não é apenas saber e
saber não é apenas ciência. Conhecer é procurar a verdade. Conhecer a verdade
tem como finalidade o conhecimento do bem. Estar na verdade não é apenas
praticar o bem, é ser bom. Chesterton dizia que o filantropo pratica o bem, o
Santo é bom. Como diz o Papa na sua exortação apostólica Evangelii Gaudium,
citando Bento XVI, “no início do ser cristão não existe uma grande ideia ou uma
decisão ética, mas sim um encontro. Um encontro com uma Pessoa concreta que dá
à vida um novo horizonte, um rumo decisivo”.
A fé não carece de demonstração na
medida em que é uma relação com alguém que amamos. De que cor é o amor, qual a
sua forma geométrica? Tal como o vento, a sua intensidade, a sua força…Chesterton
dizia que o homem é o maior salto do reino animal; Cristo o maior salto do
reino dos homens.
Nos evangelhos encontra-se uma mensagem inefável de uma
personalidade concreta. Ser cristão é estar apaixonado, é ser louco.
Quisera
ser louco, acompanhado por milhões de loucos, numa cacafonia de línguas;
quisera ser louco acompanhado de loucos como Cauchy, Schrödinger, Gauss, Volta, Marconi, Heisenberg, Pasteur; louco a ouvir música de Haydn ou de Bach, de Verdi ou
Pachelbel; louco e pintar como Rubens ou Rembrandt, como Velazquez ou
Caravaggio; louco internado numa biblioteca ou numa universidade.
As catedrais
góticas são o meu hospício, as festas de verão as minhas manias, o silêncio o
meu mutismo, as orações os meus neologismos, o vislumbre de Deus as minhas
alucinações, a ajuda aos outros o meu delírio, a vaidade a minha ausência, a
simplicidade a minha rigidez, a bajulação a minha neutralidade afectiva, a
mulher que amo a minha dupla personalidade, a eternidade a minha paranóia,
Cristo a minha ideia delirante.
António Campos
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