Gilbert Keith Chesterton nasceu em Kensington, distrito central de Londres, em
29 de maio de 1874, filho de Edward Chesterton e Marie Louise Keith. A primeira
filha do casal, Beatrice, morreu aos 8 anos de idade, quando Chesterton tinha 3 anos. Gilbert teve como irmão mais novo, Cecil, que morreu em 1918 durante a Primeira Guerra Mundial.
Embora baptizado segundo a tradição anglicana, a sua família era liberal e unitarista - aquilo a que hoje chamaríamos relativismo e recusa de Jesus Cristo como Deus-homem. Chesterton sempre identificou a Igreja Católica com a Virgem Maria: “Mal consigo recordar um tempo em que a
imagem de Nossa Senhora não se erga muito concretamente no meu espírito [...].
Quando recordava a Igreja Católica, recordava-a a Ela; quando tentava esquecer
a Igreja Católica, tentava esquecê-la a Ela”.*
A infância de Chesterton foi marcada pela alegria genuína do meio familiar: a
casa sempre cheia de primos e amigos, povoada de iluminuras medievais, estampas
antigas, fadas, gnomos e duendes do teatro de marionetas com que seu pai
divertia as crianças. O seu pai era sócio de uma imobiliária que ainda hoje existe, a Chesterton's Humberts e reformou-se cedo por forma a ficar mais tempo em casa com a família. Pode dizer-se que fazia parte da "middle class", a classe média-alta.
Chesterton estudou no Colégio de São Paulo, perto de sua casa, onde teve uma adaptação difícil,
duramente contrastante com a alegria do lar. Míope e muito alto, a sua carteira no fundo da sala impedia a sua visão clara do quadro da sala de aula e terá sido, provavelmente, responsável pela sua fama de distraído. Eis, segundo suas próprias
palavras, um resumo da sua juventude: “Eu era um pagão à idade de 12 anos, e um
completo agnóstico aos dezasseis... Eu nunca li uma linha da apologética
cristã.” Foi inclusive atormentado na adolescência por pensamentos de suicídio.
Não foi para Oxford, como o seu futuro cunhado, Oldershaw, e a maioria dos seus amigos, mas para a Escola de
Artes da Universidade de Londres (1893-95), cuja licenciatura não chegou a terminar. Começou a trabalhar como editor numa pequena livraria de livros esotéricos e de espiritismo, a Rodney ("Devolvi muitos livros para lares que deveriam ser pequenos manicómios"), tendo-se mudado pouco depois para a muito maior Fisher Unwin, onde permaneceu até 1901. Estreou na imprensa como crítico literário, mas
logo teve seus horizontes jornalísticos ampliados por outros temas.**
Prolífico e
versátil, o escritor inglês sentia-se à vontade em praticamente qualquer género
literário e assunto. Poeta, narrador, ensaísta, desenhista, teólogo, filósofo,
jornalista, historiador, biógrafo, crítico literário, conferencista... Os seus voos
poéticos iam do cómico O Vegetariano Lógico à grave e magnífica Lepanto, ambos
textos de 1915.
A primeira obra de Chesterton, um conjunto de poemas e ilustrações, recebeu o
título de Greybeards at Play e foi publicada em 1900. Já nela se nota o seu
humor sadio e o desejo permanente de transmitir o gozo pela realidade das
coisas, pelo simples fato de as coisas serem. “No espanto há um elemento
positivo de prece”, escreveu mais tarde. Chesterton foi um apaixonado
pelo universo, entendido aqui, é claro, não num sentido panteísta. Deleitava-se
nas coisas porque sabia perfeitamente bem que elas poderiam não ter existido:
“cada homem na rua é um grande poderia-não-ter-sido”.
Durante a guerra dos Boers (1899-1902) na África do Sul, Chesterton escrevia
artigos no semanário liberal The Speaker contra a guerra, que considerava
injusta e imperialista. Nessa época travou estreita amizade com Hilaire Belloc,
deputado na Câmara dos Comuns, que também se opunha à investida militar. Conhecera Belloc por meio de Oldershaw e E. C. Bentley que o tinham conhecido como professor em Oxford. Belloc
e Chesterton tornaram-se tão próximos que Bernard Shaw chegou a falar num certo
“monstro biforme Chesterbelloc”, não porque os considerasse parecidos, mas justamente porque os considerava completamente diferentes. Shaw admirava a inteligência de Chesterton, mas ignorava Belloc. Os dois amigos desenvolveram juntos a teoria
do Distributismo (ou Distribucionismo), teoria política crítica do capitalismo
e do socialismo.
No ensaio Eugenia e Outros Males (1922), Chesterton atacava o que no seu tempo
parecia ser uma das ideias mais progressistas, a ideia de que a raça humana
poderia e deveria dar origem a uma versão superior de si mesma. Era uma ideia muito popular na aristocracia inglesa (e não só) de que Eduardo VIII foi o rosto mais conhecido. Temos aí um
exemplo de sua análise lúcida e profética dos acontecimentos que desembocariam
no nazismo.
Chesterton discutiu com alguns dos mais célebres intelectuais de seu tempo:
George Bernard Shaw, Herbert George Wells, Bertrand Russell, Clarence Darrow.
Atraía multidões aos debates embora o juízo sobre o vencedor em geral dependesse da ideia prévia de quem assistia, como sempre acontece neste tipo de debates. No trato pessoal nunca deixava o
cavalheirismo e a delicadeza de lado. Todos os seus oponentes o tratavam com
o máximo respeito e estima; Shaw, por exemplo, chegou a dizer: "O mundo
não agradeceu o suficiente a Chesterton".
Esta influência continuou depois da sua morte. Clive Staples Lewis, escreveu: “Chesterton tem mais razão que todos os
outros modernos juntos”. Chesterton também influenciou a conversão de Evelyn
Waugh e, indiretamente, a de Graham Greene. E Dorothy Sayers confessou que foi
a Ortodoxia (1908) que lhe revigorou e salvou a fé na juventude, o mesmo
sucedendo a Ronald Knox. E – podemos perguntar – quantos cristãos anónimos
não deverão à leitura de Chesterton a descoberta, ou redescoberta, daquela “beleza
tão antiga e tão nova” de que fala Santo Agostinho ao se referir à fé católica?
Chesterton foi um grande homem, também, porque sabia rir-se de tudo e de todos,
a começar por si mesmo: num desenho intitulado “Como eu sou”, vemo-lo muito
gordo (como de facto era), desajeitado, cabelos desgrenhados; num outro, “Como
eu gostaria de ser”, encontramo-lo de perfil, barba desenhada, porte nobre.
Saber rir-se de si mesmo, afinal, é uma das marcas da verdadeira humildade.
Defendia o matrimónio e a família, o homem comum, o bom senso, a beleza e a
Igreja. Desconfiava da concentração de poder e da abundância material. Era
otimista, mas não tolo. Tinha uma visão alegre da existência e gostava da
polémica e dos paradoxos.
Sobre esse último ponto, aliás, vale ressaltar que Chesterton recorria
constantemente aos paradoxos não como um garoto em busca de auto-afirmação, mas
com a intenção consciente de apresentar a realidade tal como ela é, um equilíbrio de opostos contraditórios, mantidos permanentemente em tensão, como explica em Ortodoxia.
Na obra Hereges (1905), dedicada a seu pai, Ed, atacou com fino humor e lógica impecável o
subjetivismo ético de George Moore, o socialismo desumanizador de Bernard Shaw,
o imperialismo de Rudyard Kipling, o historicismo positivista de Herbert George
Wells, o esteticismo aético de Oscar Wilde. Chesterton explicava ali por que não
era ele próprio um seguidor das filosofias da moda: não as seguia porque as
compreendia, via a desordem sobre a qual estavam fundadas. O escritor inglês,
afinal, sempre soube entender as contradições dos seus contemporâneos; foram
eles, com as suas inúmeras contradições, e não os cristãos, que o empurraram para
a fé cristã.
Ortodoxia (1908), uma das suas obras-primas, pode ser vista como um resumo da
filosofia de Chesterton. O resumo daquilo em que acreditava e que um dia
percebeu, não sem espanto, coincidir com o credo cristão. O livro foi escrito
como resposta a um crítico de Hereges, que cobrava de Chesterton a exposição
da sua própria visão do mundo. Dizia o crítico que atacar e destruir todo o
mundo era fácil; difícil mesmo era construir uma visão sólida e coerente da
realidade. Então Chesterton, “sempre disposto a escrever um livro à menor
provocação”, escreveu Ortodoxia, em que tentava demonstrar, entre outras
coisas, que (1) o racionalismo levado às últimas consequências conduz ao
suicídio do pensamento; (2) a tradição tem um caráter democrático (dar o
direito de voto aos nossos antepassados); (3) a teoria da felicidade
condicional, ou “ética do país das fadas”, é a mais sadia: tudo é permitido, em
troca de uma pequena coisa que é negada e (4) a doutrina cristã traz um acerto
paradoxal (o ponto de equilíbrio entre virtudes contrárias).
Sobre o segundo ponto, o caráter democrático da tradição, isto é, a transmissão
da cultura, do legado grego, romano e judaico e do legado da Europa nos últimos
dois mil anos, vale dizer que, num mundo de devastação cultural como o actual,
essa herança espiritual corre grande perigo. Tratava-se, para Chesterton, de
uma tradição sagrada, que salvaguarda as verdades eternas, que falam com
autoridade para cada nova geração. A mais alta função da arte, portanto, é
expressar os fatores comuns mais elevados da vida humana e não os seus
denominadores comuns inferiores – os amores da vida e não os seus vícios. É
nesse sentido que devemos entender a literatura de Chesterton.
Ao contrário da austeridade que a princípio o título pode sugerir, Ortodoxia
significa nada mais, nada menos que “a opinião certa”. Quer dizer que há uma
opinião certa e outra errada sobre o que somos nós e o mundo onde vivemos, e
que a diferença entre as duas importa fundamentalmente no modo como vivemos.
Embora não seja uma autobiografia, é uma obra bastante autobiográfica.*** Embora
Chesterton não fosse católico quando a escreveu, Ortodoxia é provavelmente um
dos melhores livros católicos escritos no século XX.
A filosofia de Chesterton ali exposta dava-lhe liberdade para aceitar ou
rejeitar os milagres com base nas evidências. Já o filósofo determinista estava
obrigado, por princípio, a rejeitar todos os milagres sem sequer os examinar.
Logo, Chesterton, o ortodoxo, era mais livre que o filósofo determinista,
escravo de seus postulados e preconceitos.
Naturalmente, com a fama literária, chegaram convites para conferências nos
mais distantes pontos da Inglaterra e a aquisição de novos e importantes
amigos: Joseph Conrad, Henry James, Baden Powell, Winston Churchill e Thomas
Hardy, para citar apenas alguns.
As suas inquietações espirituais canalizaram-se em certo momento para o
espiritismo. Nessa mesma época conheceu Frances Blogg, sua futura esposa. Ele,
idealista e distraído; ela, prática e de fortes convicções religiosas,
anglicana praticante. Foi a ela que dedicou o seu melhor poema, "The Ballad of The White Horse", que mais não é do que uma epopeia da Igreja e a alegoria da conversão. Enquanto Frances era ordenada, metódica, comedida e
pontual, o marido era o típico génio distraído, pródigo, desleixado com a
aparência pessoal e sem ter ideia do tempo. Shaw o definiu como um “querubim
gigantesco”: um menino disfarçado de adulto, com sua cara gorda e redonda e sua
expressão infantil.
Embora apreciasse muito a companhia de crianças, Chesterton não teve filhos
porque a sua esposa não os pôde ter, mas em compensação teve uma excelente
secretária, a Sra. Dorothy Collins, que foi como uma filha adotiva para o
casal. Por fim, ela acabou administradora do legado literário do
patrão, levando adiante a publicação de suas obras após a morte, a maioria das quais sem direitos de autor.
Apesar da distração, a capacidade do “apóstolo do senso comum” para o trabalho
era impressionante: Chesterton escreveu uma centena de livros, contribuições
para outros duzentos, centenas de poemas (entre os quais um épico), cinco peças
de teatro, cinco romances e uns duzentos contos, incluindo a popular série de
contos policiais do Padre Brown, que foi inclusive adaptada para televisão.
Escreveu mais de 4000 artigos, entre os quais trinta anos de colunas semanais
para o Illustrated London News e treze anos de colunas semanais para o Daily
News, além dos textos diversos que redigiu para o seu próprio jornal, G.K.’s
Weekly. Tinha um programa semanal na BBC até à data da sua morte. Fez durante a sua vida duas digressões aos Estados Unidos, sendo doutor Honoris Causa por várias universidades americanas.
Foi esse alegre homenzarrão inglês que escreveu um romance intitulado O
Napoleão de Nothing Hill (1904), que inspiraria Michael Collins a liderar o
movimento pela independência da Irlanda, e também um artigo no Illustrated
London News que inspiraria Mohandas Gandhi a liderar o movimento que pôs fim ao
domínio colonial inglês na Índia.
Em 1911 começou a sua aproximação mais séria ao catolicismo. Foi nesse período
que o escritor inglês conheceu, por meio de um casal de judeus, seus amigos, o Padre John O'Connor, que lhe inspirou a
criação de um dos personagens mais conhecidos da literatura policial inglesa: o
Padre Brown. O clérigo “baixinho, de rosto afável e expressão de duende”, como
o definiu o seu criador, resolve todos os casos, não apoiado na
lógica mais rigorosa e no método científico, mas partindo simplesmente da sua
experiência, do senso-comum, do conhecimento da natureza humana. O padre
detetive afirma numa das suas histórias: “O criminalista olha para o
criminoso como um ser estranho e abjeto; eu vejo-o como a mim mesmo, capaz de
cometer qualquer barbaridade: daí que me pergunto como faria o que ele fez.”.
As histórias do Pe. Brown, embora muito divertidas, não são apenas entretenimento,
porque a habilidade do detetive para solucionar crimes está baseada no seu
conhecimento profundo da natureza humana, adquirido no dia-a-dia do
confessionário.
Do contato com o Pe. O'Connor nasceu o desejo do anglicano Chesterton se tornar
católico. Nesse processo foi fundamental a influência de três convertidos ao catolicismo: o cardeal John Henry Newman, o escritor Maurice Baring e o Pe. Ronald Knox. No livro Catholic Church and Conversion, de que Belloc fez o prefácio, Chesterton afirma na Introdução, a que chamou ironicamente Uma Nova Religião: “A Igreja Católica é o lar
natural do espírito humano. A estranha perspectiva da vida, que ao princípio
parece um quebra-cabeças sem sentido, tomada sob esse ponto de vista, adquire
ordem e sentido”.
O homem que tanto podia debater seriamente com pensadores do porte de um
Bertrand Russell quanto se divertir com crianças numa festa de aniversário,
entrou na Igreja Católica em 1922. A sua conversão foi então um dos mais
comentados eventos religiosos na Europa desde a conversão do cardeal John Henry
Newman, ocorrida 75 anos antes. Mais tarde, também sua esposa Frances se
converteria ao catolicismo.
Na sua Autobiografia (1936), afirmava que a teologia católica é “a única não só
que pensou, mas que pensou sobre tudo. Que quase todas as demais teologias ou
filosofias contêm alguma verdade, não o nego; ao contrário, é isso o que
afirmo, e é disso que me queixo. Sei que todos os demais sistemas ou seitas se
contentam com seguir uma verdade, teológica ou teosófica, ética ou metafísica;
e, quanto mais se reclamam de universais, mais isso significa que colhem algo e o
aplicam a tudo”. Só a teologia católica era, e é, universal.
Quando lhe perguntaram por que afinal se converteu ao catolicismo, Chesterton
respondeu: “Porque me queria livrar dos meus pecados.” E concluiu: “A
Igreja Católica é a única que realmente apaga os pecados.” Ecoando a história
de Santo Tomás e a velhinha, Chesterton confessava na Autobiografia que o
catecismo lhe ensinou tudo o que a ciência, a filosofia pagã e o mundo não
sabem. Ensinou-lhe o óbvio: que o orgulho e o desespero são pecados e que o
único remédio para eles é estar no mundo com humildade. Só a aceitação de
grandes mistérios, concluía Chesterton, depois de estudar inúmeras filosofias e
aderir a diversos “ismos”, é capaz de manter a lucidez do espírito humano; a sua
negação conduz invariavelmente à loucura: “Aceitar todas as coisas é um
exercício, mas compreender todas as coisas é um frenesi.” E mais adiante,
comparando o lunático com o poeta (que seria uma pessoa sã), escreveu: “O poeta
procura apenas a exaltação e a expansão, isto é, procura um mundo onde se possa
distender. Pretende ele, simplesmente, enfiar a cabeça nos céus, ao passo que o
lógico se esforça por enfiar os céus na cabeça. E é a cabeça que estala.”
Uma das vantagens da conversão é sabermos a quem devemos agradecer a alegria de
existir; é, melhor dizendo, termos a quem agradecer. “O teste de toda
felicidade é a gratidão; e eu me sentia grato, embora mal pudesse saber a
quem”. Eis a maneira de Chesterton expressar a sua realização: afinal, o bem é
realmente bem, o belo é realmente belo, o verdadeiro é realmente verdadeiro.
Estava em casa, por fim.
Toda a obra de Chesterton é como que um hino à alegria. É alegre e arriscado
viver. A existência do livre-arbítrio, contrariando o determinismo, torna a
vida perigosa e excitante: a partir daí todas as nossas escolhas são
infinitamente sérias e potencialmente perigosas.
Depois de Hereges e Ortodoxia, outra obra-prima foi escrita no fim de sua
vida: a biografia São Tomás de Aquino (1933), cujo valor foi atestado por
Étienne Gilson, famoso filósofo tomista, que a considerou “o melhor livro
jamais escrito sobre São Tomás.”
Mais afastado da imprensa, o “querubim gigantesco” dedicou os anos de 1923 e
1924 para redigir, com a tranquilidade que lhe convinha, aquela que seria
considerada por muitos a sua melhor obra: O Homem Eterno (1925), em que expunha
a sua filosofia da História, tendo como eixo o mistério de Deus encarnado. Esse
livro foi crucial para a conversão de Lewis, que acabou por se tornar também um
dos apologistas cristãos mais importantes do século passado. É ela que contém o famoso argumento ontológico de Jesus Cristo, popularizado por Lewis, tal como a distinção fundamental entre a religião mitológica e a religião alegórica e, finalmente, o conceito de que o monoteísmo foi uma inflexão fundamental na natural tendência humana para o politeísmo.
Em suma: em todas as suas obras é patente o entusiasmo do escritor pela
realidade, pelo que é. Chesterton era o grande inimigo do racionalismo
idealista e céptico. É notável nas suas obras a atitude profundamente humilde
do espectador que se maravilha diante do quadro à sua frente: a realidade da
Criação.
Chesterton guardou a fé até o último instante, recebendo a extrema-unção de seu
amado Padre O’Connor. Faleceu em 14 de junho de 1936, aos 62 anos, em
Beaconsfield, Buckinghamshire. O Papa Pio XI, em telegrama ao povo da
Inglaterra, escreveu: “Santo Padre profundamente consternado morte de Gilbert
Keith Chesterton, devoto filho Santa Igreja, dotado defensor da Fé Católica”.
A obra do criador do Pe. Brown foi saudada por Ernest Hemingway, Graham
Greene, Evelyn Waugh, Jorge Luis Borges, Gabriel Garcia Marquez, Karel Capek,
Marshall McLuhan, Paul Claudel, Dorothy Leigh Sayers, Agatha Christie, Sigrid
Undset, Ronald Knox, Kingsley Amis, Wystan Hugh Auden, Anthony Burgess, Ernst
Friedrich Schumacher, Orson Welles, Alfred Hitchcock, Ernst Bloch, Franz Kafka e Neil Gaiman. Segundo Thomas Stearns Eliot, Chesterton “merece o
direito perpétuo à nossa lealdade”.
A respeito da missão de Chesterton, o Padre Leonardo Castellani ressalta que
ela consiste em “rir, fantasiar, disputar, atirar-se no pasto e andar de pernas
para o ar, cantar as verdades mais gordas à tesa Inglaterra, denegrir
copiosamente os políticos, banqueiros, cientistas e literatos, escarnecer os
inimigos e crer na Igreja Católica Romana; mas a graça está em que isto último
é o que dá poder ao primeiro”.
Já em A Abolição do Homem, Clive Staples Lewis assinala: “Até agora, os planos
educativos conseguiram pouco do que pretendiam e, de fato, quando os relemos –
vendo como Platão faria de cada criança ‘um bastardo criado numa repartição
pública’, como Elyot desejava que a criança não visse homem nenhum até aos
sete anos e, completada essa idade, não visse nenhuma mulher, como Locke
queria os meninos de sapatos esfarrapados e sem aptidão para a poesia –,
podemos agradecer a benéfica teimosia das verdadeiras mães, das verdadeiras
amas e (sobretudo) das verdadeiras crianças por preservar a sanidade que a raça
humana ainda possui.”
Sem hesitar, incluímos o “querubim gigantesco” entre as “verdadeiras crianças”,
aproveitando para lhe agradecer a benéfica lucidez que pode preservar a
sanidade da raça humana – ou, ao menos, de alguns representantes da raça.
Chesterton ensina, como ensinou a vários grandes homens, e também a muitos
pequenos cristãos, anónimos, a ver o cristianismo com novas lentes. Assim como
os antigos monges costumavam recomendar a leitura dos Salmos para curar a tristeza
ou a acídia, também não podemos deixar de recomendar, contra uma visão cinzenta
e sem graça do cristianismo, a leitura desse grande médico de almas que foi
Gilbert Keith Chesterton.
Nota biográfica preparada por Davi James Dias,
*Chesterton foi agnóstico no final da adolescência e manifestou algum desprezo e antagonismo pela Virgem Maria (poema Hail Mary ainda no JDC), pelos papistas (fiel à tradição britânica após o homem gordo com as seis mulheres) e pela Igreja Católica (religião obscura), mas não pelos seus Santos, como é manifesto no poema São Francisco Xavier, escrito aos 18 anos, que ganhou o prémio Milton no colégio de São Paulo, ainda hoje uma das melhores escolas secundárias públicas da região de Londres. Portanto a afirmação "mal me lembro" deve ser tomada literalmente. Para mais detalhes:
http://sociedadechestertonportugal.blogspot.pt/2014/08/chesterton-para-principiantes-uma.html
**Após a Slade School of Arts, Chesterton trabalhou seis anos (1894-1900) para uma livraria e editora, a Fisher Unwin, onde teve oportunidade de ler e rever uma miríade de livros que lhe forneceram a cultura prolífica de base que possuía. O primeiro jornal para onde escreveu foi o Clarion, dominado pelos socialistas ateus, com cujo proprietário, Robert Blatchford, teve mais tarde, as famosas controvérsias Blatchford.
***Chesterton afirma isso mesmo, pelo seu próprio punho, no Prólogo da edição americana de Ortodoxia.
Esta nota biográfica, agora ligeiramente revista, fica como o marco que me levou a mim e a outros com quem partilho a vida, ao encontro de Chesterton. Esta biografia também é um exemplo de fair-play, de respeito pelos outros: foi-me indicada pelo Prof. Doutor Faria de Abreu, comunista e ateu, meu mestre e mentor, por quem nutri sempre admiração, pelo seu carácter e inteligência, que sempre soube ser correspondida. Que Deus guarde a sua alma.
António Campos
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