O materialismo filosófico possui várias dimensões. Talvez a mais importante seja a da
A
filosofia materialista conduziu a duas conclusões diferentes:
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Para Herbert Spencer e Huxley, darwinista, existia uma visão optimista do
futuro alicerçada numa inevitabilidade do progresso evolucionista. Os
positivistas como Comte também acreditaram numa crescente organização social,
política e religiosa no caminho fixo rumo à perfeição.
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A outra conclusão era a de que o homem estaria refém de um universo
mecanicista, indiferente, e das forças da natureza, que exerceriam uma força
arbitrária sobre ele – o dilema do homem pré-determinado e enclausurado.
Incapaz de determinar o seu destino, o homem cessa a sua condição de ser moral.
O
materialismo filosófico moderno é, pois, ou optimista ou pessimista. A teologia
do livre arbítrio e do pecado foi pois rejeitada em favor de um comportamento
naturalista determinado por forças biológicas, psicológicas ou sociológicas. A
concepção de uma razão inata e de uma ética universal foi substituída pela
concepção pragmática de que não existem realidades prévias impressas na
natureza humana ou no universo e a de que as normas morais, a ética social e a
lei, evoluem naturalmente como resultado da
contingência e da experiência.
Para
os pessimistas o homem encontra-se excluído da redenção. Para os optimistas o
homem redime-se a si mesmo. A Encarnação, a cruz, a ressurreição, ficam
esvaziadas de significado. Pio X na encíclica Pascendi Dominici Gregis classificou o modernismo como a síntese de
todas as heresias. Os modernistas, influenciados por Henri Bergson, rejeitaram
a ideia de que a fé é de natureza intelectual. Defendiam que Deus era mais
conhecido pelas emoções do que pela razão e de que o dogma resultava da experiência
concreta e se encontrava sob a influência do processo evolutivo. Partilhavam as
premissas neo-kantianas de que o sobrenatural não podia ser apreendido pelo
conhecimento racional. Essa foi a premissa de Nietzsche.
Qual a natureza do ser e da
existência? Existe uma realidade externa ao sujeito pensante? Como se explica o
pensamento? Como se comunica Deus com o homem? Existe uma estrutura moral no
universo apreensível por todos? Estas são as grandes questões filosóficas e epistemológicas.
Chesterton
responde dizendo que existe uma realidade de objectos tangíveis fora de nós
próprios. A realidade existe. A certeza e a consciência existem. O conhecimento
inicia-se com o que apreendemos pelos sentidos mas é completado pelo intelecto
conceptual (comum a todos os homens) que é capaz de intuir a natureza essencial
das coisas.
Portanto,
a verdade absoluta e universal existe e está disponível a todos os homens
mediante o uso da razão. A razão separa o homem dos animais e liga-o a Deus. O
intelecto segue o trajecto que o conduz a Deus mediante a busca da causa
primeira e da razão suficiente de todas as coisas. A fé é, então, uma faculdade
do intelecto e o produto de um processo racional.
Quer
o idealismo, quer o pragmatismo, quer o materialismo, quer o cepticismo, quer o
utilitarismo, carecem de senso comum, produzindo apenas dúvida e desespero, e
espalham as sementes do permissivismo moral e do julgamento privado subjectivo.
O homem oscila então entre sujeito ou ordenador de uma moral sempre em mudança ou objecto de uma tirania da lei da selva, à qual se tem que cegamente submeter, como apenas mais um dos animais. Numa versão é um deus de um universo pequeno –
aquele que tem dentro da sua cabeça -, na outra é um mero objecto minúsculo das
forças terríveis de um universo monstruoso e inexorável; mera folha seca
açoitada pelo vento, abandonado ao determinismo da natureza e da História.
Para
Chesterton, o homem é dotado de livre-arbítrio, sendo responsável pelas suas
acções morais. Essa responsabilidade implica uma fonte externa para a
moralidade e uma aplicabilidade universal, para manter a igualdade e justiça
perante todos os homens. Mas o homem também possui a faculdade do
arrependimento. Ao escolher tal via o homem reencontra o caminho da virtude. O
facto de o homem ser pequeno não o inferioriza no universo, pois no universo as
coisas pequenas têm o mesmo poder das grandes, como o atesta a microscopia e a
ultra-estrutura. O homem não é menos importante do que a girafa ou o elefante.
Por outro lado, se o homem não se colocar numa posição pequena, i.e., de
humildade, não franqueia a porta do conhecimento. Conhecer é aprender e só
aprende quem escuta e age, não quem pensa ser a fonte do próprio conhecimento.
O
que o tomismo ataca no modernismo são as suas premissas formais, neo-kantianas:
o ênfase no sujeito do conhecimento em vez de no objecto, e a assumpção de limites
no intelecto racional para a apreensão de uma realidade universal. O tomismo assume
um antagonismo relativamente à ideia de uma realidade instável, mera mudança ou
fluxo, traduzindo-se numa oposição aos subjectivistas neo-kantianos, como Dewey
e Bertrand Russell, que defendiam precisamente que os conceitos e o
conhecimento conceptual são mutáveis e modificáveis (se é que o conceito precisamente se lhes pode ser aplicado,
seguindo o seu próprio raciocínio).
Contrariamente
a subjectivistas como Freud, Lawrence, James Joyce, Franz Kafka e Nietzsche,
que viam no irracional submerso “cá dentro” a origem última das coisas, o
tomismo acreditava numa realidade externa, na validade dos sentidos e da razão
para a alcançarem e na existência de verdades universais e imutáveis.
Cada
idade rescreve a História para coincidir com a sua própria visão da realidade.
António Campos
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